Projeto realizado em presídio ajuda no combate à dengue e leva educação lúdica a crianças

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Promovido pela Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), o “Arte Com Pneus” já retirou do meio ambiente mais de 4,2 mil pneus sem uso, que se transformaram em brinquedos para parques de diversões em 12 Escolas Municipais de Ensino Infantil (EMEIs), beneficiando, aproximadamente, 5 mil crianças.

Desenvolvido há cerca um ano e meio na Penitenciária de Segurança Máxima de Campo Grande, além do fator social  – que une ocupação produtiva e capacitação de detentos à oportunidade de levar educação lúdica e diversão às crianças –  o trabalho também se destaca pelo papel ambiental que vem exercendo, principalmente em tempos de proliferação do mosquito Aedes aegypti, que, no último mês, devido aos milhares de casos notificados de dengue, levou a capital do Mato Grosso do Sul a decretar situação de emergência.

Isso por que pneus jogados no meio ambiente demoram cerca 600 anos para se decomporem, podendo acumular água e servir de criadouro para o mosquito, que é responsável, ainda, pela transmissão da Zica e da Chikungunya.

Ao todo, o projeto envolve a participação de oito internos da Máxima, que atuam desde o corte à finalização das peças. Pelo trabalho recebem um dia de remição na pena a cada três de serviços prestados. A iniciativa conta ainda com outros cinco reeducandos, que cumprem pena no regime semiaberto no Centro Penal Agroindustrial da Gameleira, responsáveis pela instalação dos brinquedos nos parques.

Segundo o diretor da penitenciária, Mauro Augusto Ferrari de Araújo, a intenção agora é ampliar as possibilidades, com a instalação de um novo espaço dentro do presídio, com estrutura ampla e coberta: “Pretendemos dobrar o número de internos trabalhando e, com isso, mais pneus serão retirados do meio ambiente, contribuindo para eliminar o foco do Aedes aegypti”, comenta, reforçando que o “Arte com Pneus”, representa uma ação múltipla, abrangendo as áreas de saúde, segurança pública e educação.

Idealizador e coordenador do projeto na Máxima, o agente Vinícius Saraiva de Oliveira afirma que, além da doação de pneus, muitas vezes, ele e outros colaboradores recolhem das ruas os pneus que são jogados em terrenos baldios, na beira de estrada. “É muito importante a gente poder contribuir para evitar a proliferação do mosquito. “A preocupação com o acúmulo da água está presente também durante a montagem das peças, por isso os internos perfuram os pneus e enterram a base deles durante a instalação dos parques”, comenta o servidor, que é responsável pela iniciativa ao lado do técnico da Secretaria Municipal de Educação (Semed), Felipe Augusto da Costa Souza.

O agente penitenciário ressalta que a cada EMEI a ser atendida, é lançado o desafio de inovar. “Sempre tem um brinquedo diferente, no último foi um trator, eu trago uma ideia, mas eles mesmos criam o brinquedo”, informa. “Em média, eles fazem cinco brinquedos por dia, todos participam, cada um com uma missão. Se dividem em montagem, pintura e customização”, complementa.

Cumprindo pena há 9 anos, o interno Vando Aparecido Vicente Santos, 40 anos, atua no projeto desde o seu início e garante desenvolver desde o recorte, montagem até a pintura. Uma das principais preocupações, segundo ele, é com o processo de seleção. “Os que estão com arame não utilizamos para não machucar as crianças, então tem todo um cuidado, uma preparação, o que não pode ser utilizado é enviado para o eco ponto”, pontua.

Para o detento, saber que sua arte tem beneficiado centenas de crianças é motivo de orgulho. “Quando eu vi as imagens das crianças brincando, sorrindo, até me emocionei; então saber que eu posso fazer a diferença na vida de alguém eu me sinto valorizado, é realmente gratificante”, revela. “Participar disso também tem contribuído nos meus dias aqui dentro, em todos os aspectos, principalmente no meu psicológico, e agora minha perspectiva para o futuro é cuidar da minha família”, garante.

Há cinco meses, transformar pneus em brinquedos também faz parte da rotina do reeducando Fernando Pereira Ortega, 27 anos, que há dois está na penitenciária. A tarefa tem trazido novos conhecimentos ao custodiado. “Aprendi muita coisa, tem uma serventia muito grande, pois hoje sei fazer cada etapa da confecção dos brinquedos graças ao apoio e ajuda dos colegas. Meu comportamento mudou, aprendi a valorizar as pequenas coisas, o trabalho em equipe, a família e a liberdade”, afirma.

Reconhecido e elogiado pela mídia, autoridades e a população em geral, o “Arte com Pneus” é uma das ações desenvolvidas pela Agepen que impactam diretamente em benefícios para a massa carcerária, bem como para toda a sociedade e tem se consolidado como exemplo de boas práticas. No ano passado, o projeto recebeu uma homenagem com o “Prêmio Ecologia e Ambientalismo”, concedido pela Câmara Municipal de Campo Grande.

“Não esperava que o projeto ganharia essa amplitude toda e hoje me sinto muito feliz pelo rumo que essa ideia tomou, tudo começou com uma xícara de jardim feita com pneu pelo reeducando. Aí pensei: se ele fez a xícara ele pode fazer um brinquedo, como eu sou professor de Educação Física também já pensei nos benefícios para os alunos. Apresentei a ideia para a direção da Agepen e recebi o apoio necessário prontamente. Acredito que por isso a iniciativa tem dado tão certo até hoje”, finaliza Vinícius.