Imagens de satélite podem ser uma importante ferramenta para ampliar o conhecimento humano quanto às condições, quase em tempo real, de um determinado território em que um indivíduo esteja inserido. Diante dos benefícios do uso tecnologia, indígenas sul-mato-grossenses da etnia Kadiwéu participaram do segundo módulo do curso sobre SIG (Sistemas de Informação Geográfica) que foi promovido, em Brasília (DF), na última semana. Eles são do Território Indígena Kadiwéu, que tem 538 mil hectares, em Porto Murtinho.
O curso foi organizado pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), em parceria com a COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), e faz parte do Projeto Bem Viver do Nature and Culture International e IEB (Instituto Internacional de Educação do Brasil). Etnias de diversas partes do Brasil também marcaram presença nas aulas que trabalharam conteúdos como o Somai (Sistema de Observação da Amazônia Indígena) e o ACI ( Alerta Clima Indígena).
O objetivo da capacitação foi fortalecer a autonomia dos indígenas na construção de mapas que possam contribuir com a gestão territorial da Terra Indígena. Por isso, o Programa Corredor Azul (PCA), por meio da Wetlands International Brasil e da Mupan (Mulheres em Ação no Pantanal), levou duas lideranças Kadiwéu para participar do curso.
“Há quatro anos, os Kadiwéu e o Programa Corredor Azul têm uma parceria que tem rendido diversas conquistas como construção de viveiro, intercâmbio com outras etnias e a elaboração de um documento de gestão territorial: o Plano de Vida. Então, a capacitação vem para dar mais autonomia de trabalho e agregar valor às atividades de conservação ambiental que eles vêm desenvolvendo em conjunto com a nossa equipe”, explica o analista em geoprocessamento Pedro Cristofori que, em Brasília, fez a monitoria dos indígenas no curso.
Benefícios – Tanto para quem percorre longas distâncias em ações de prevenção e combate ao fogo quanto para ações de plantio de mudas nativas para recuperação de áreas degradadas próximas de nascentes, ter ferramentas de monitoramento remoto pode ser muito vantajoso, como afirma o presidente da Abink (Associação de Brigadistas da Nação Kadiwéu), Mesaque da Rocha.
“Por satélite, as informações são atualizadas a todo momento e isso ajuda a Abink. Como brigadistas, poderemos fazer a leitura de mapas (virtuais) antes de ir a campo ou planejar o plantio de árvores com base em informações retiradas do sistema. Outro ponto de interesse que temos é usar essa tecnologia a favor da pesquisa do pau santo, uma árvore nativa do nosso território que é essencial para as pinturas da cerâmica Kadiwéu”.
Coordenador do curso SIG (Sistemas de Informação Geográfica), Ray Pinheiro afirma que essa tecnologia é acessível, com baixo custo, e que, de cima, os satélites podem colaborar com setores da vida que muitas vezes são desconhecidos pela população
“Eles podem fazer um censo da comunidade e, a partir daí, compartilhar informações com instituições que eles acharem pertinente, podendo ser aplicadas até em campanhas de vacinação, por exemplo”, diz Ray.
Promover a identificação de espécies para coleta, produção de um roçado, identificação das aldeias, com pontos de maior ou menor densidade populacional e mapeamento de áreas sagradas para as etnias são alguns dos muitos usos desse conhecimento geoespacial, conforme Pinheiro.
Elísio Veigas, chefe de brigada e vice-cacique da Aldeia São João, acredita que o SIG pode facilitar as tomadas de decisões das seis aldeias que compõem o TI Kadiwéu.
“O curso SIG permite que a gente coloque o nosso conhecimento de campo dentro dos mapas, montando projetos e expandido essas informações para a comunidade como um todo. O Programa Corredor Azul, da Wetlands International Brasil, tem nos apoiado muito dentro dos nossos trabalhos. Esta é a segunda vez que estamos em Brasília para dar continuidade ao curso e espero replicar nas aldeias tudo que foi visto aqui”, afirmou, após a capacitação.
Representante da Nature and Culture International e do IEB, Reinaldo Lourival destaca a importância da iniciativa de atrelar tecnologia ao conhecimento tradicional.
“Dentro da ideia de construir um etnomapa e fazer uma gestão territorial e ambiental, os SIG vêm trazer uma linguagem que também é inteligível do ponto de vista do plano de gestão territorial. Ele tecnifica um pouco mais uma coisa que é criada pelos próprios indígenas que é o Plano de Vida, o plano de gestão do seu território. Nesse sentido, você coloca para eles uma ferramenta que, teoricamente, já está na cabeça deles, que é parte do seu conhecimento de mundo. Por isso, é importante essa capacitação, pois ela permite que os indígenas tenham autonomia para manusear os sistemas e transferir os conhecimentos para dentro do software. Isso ajuda eles a comunicarem essa percepção do território de uma forma mais pragmática, dentro de mapas, que servem até mesmo para a rede de parceiros dos indígenas”, conclui.
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