O poder transformador da arte tem sido utilizado com reeducandos da Capital em reuniões terapêuticas que expressam sentimentos e conflitos pessoais através dos trabalhos artesanais. O projeto “Um Olhar Além das Grades” existe há dois anos e, pelo sucesso da iniciativa, os trabalhos foram expandidos, sendo realizados agora junto a dois grupos: um formado por apenados que cumprem medidas de segurança e outro por custodiados que possuem afinidade com o projeto.
A ação é realizada pela Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), por meio do Módulo de Saúde do Complexo Penitenciário. Unindo arte e psicologia, o grupo realiza encontros duas vezes por semana, separadamente, no Instituto Penal de Campo Grande (IPCG) e no Estabelecimento Penal “Jair Ferreira de Carvalho” – presídio de segurança máxima da Capital.
Nas mãos dos reeducandos são confeccionadas desde toalhas, caixas, pinturas em cerâmica e telas, artesanatos com pirógrafo, até peças bordadas, que foram recentemente aderidas pelo grupo. Todo o material a ser trabalhado é selecionado pelo próprio reeducando e as peças a serem confeccionadas são através de demanda livre.
De acordo com a psicóloga responsável, servidora Rozimeire Zeferino, o principal objetivo é levar os internos à reflexão sobre a vida, sobre os sonhos e o futuro. “A arte nos remete à infância, a coisas belas, sentimentos bons, momentos vivenciados. Aqui tudo é muito natural, há momentos que querem se expor e falar de algo, e em outros ficam pensativos com olhar perdido, e tudo é muito válido”, explicou.
Ao todo, 28 internos participam do projeto, sendo 19 no Instituto Penal e 9 no presídio de segurança máxima. As atividades são subordinadas à Diretoria de Assistência Penitenciária da Agepen e têm como objetivo facilitar a resolução de conflitos pessoais, incentivar a busca pelo autoconhecimento e o desenvolvimento da personalidade, promovendo um potencial criativo desses reeducandos.
O interno S.W.A.M., 33 anos, confecciona desenhos em grafite e pinturas em tela e revela que a maioria dos trabalhos tem referência fotográfica e são feitas modificações personalizadas para dar um toque mais pessoal.
“Encontrei aqui uma oportunidade de trabalhar algo que eu gosto bastante e manter a mente ocupada; a remição vem como consequência e eu gosto da arte por conta dessa capacidade de mostrar a beleza e fazer pensar em algumas situações”, disse o reeducando que é formado em design gráfico.
Rozimeire ressalta ainda que no decorrer dos encontros é possível notar os avanços nos comportamentos dos participantes. “Por meio desse trabalho, muitos relatam que a ansiedade diminuiu, se sentem mais tranquilos por fazerem aquilo que gostam e aprendem um novo sentido para a vida e para o futuro deles. Eles querem participar, meu acesso com eles por meio da arte é muito mais fácil, mesmo porque ela é uma linguagem universal e está ao alcance de qualquer pessoa”, destacou.
O sucesso da iniciativa já rendeu exposição das peças até mesmo na Feira Artesão Livre, realizada no Fórum Central de Campo Grande, duas vezes ao ano. “Foi um sucesso, os trabalhos deles estão sendo muito bem aceitos e resolvemos expor este ano novamente na feira do Especial de Natal”, revela Rozimeire, explicando que os reeducandos que já possuem habilidades e técnicas profissionais aperfeiçoam os trabalhos desenvolvidos pelo outro grupo.
Como a ação não possui fins lucrativos, sempre respeitado o ritmo individual dos internos e toda a renda arrecadada com a comercialização das peças é revertida para o próprio projeto, na aquisição de novos materiais.
A técnica do bordado nas mãos do reeducando J.P.F., 36 anos, leva delicadeza e sofisticação às peças em madeira e pano. “Estar aqui é sinônimo de tranquilidade, é um privilégio estar mostrando o lado bom da gente, mesmo porque todos nós temos os dois lados, aqui a gente pode estar ajudando outras pessoas, ensinando o que sabemos”, disse.
Para o diretor-presidente da Agepen, Aud de Oliveira Chaves, projetos realizados nos estabelecimentos prisionais, como “o um olhar além das grades”, colaboram para o tratamento penal humanizado, além de ajudarem na reintegração social.
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