Talvez seja dolorido imaginar e compreender tamanha brutalidade, mas a violência sexual contra crianças e adolescentes segue crescendo expressivamente no País. Na esmagadora maioria das vezes, os crimes são cometidos por pessoas próximas que não geram nenhum tipo de desconfiança, até que em segundos a descoberta vira um pesadelo.
Corroendo infâncias e destruindo vidas, o registro de casos cresceu em Mato Grosso do Sul nos últimos anos. Só em 2018, 439 vítimas de violência sexual receberam atendimento médico no Estado após os crimes virem à tona. O número é 17,37% maior do que os registros de 2017, quando 374 pessoas abusadas foram atendidas em unidades médicas. A maior parte dos casos aconteceram com crianças entre 10 e 14 anos, segundo os dados do Sistema de Informação de Agravo de Notificação (Sinam).
Os dados fazem parte do Sinam que contabiliza os casos registrados conforme atendimento em unidades de saúde. De acordo com a Superintendência Geral de Vigilância em Saúde da Secretaria de Estado de Saúde (SES), não fazem parte desses números os casos de violência sexual que não receberam atendimento médico, o que acontece com centenas deles.
O Comitê Estadual de Enfrentamento da Violência e Defesa dos Direitos Sexuais de Crianças e Adolescentes de Mato Grosso do Sul (Comcex MS) tem cumprido papel importante na mobilização da temática em Mato Grosso do Sul. O Colegiado se dedica na prevenção e sensibilização da população e instituições.
“O Comitê exerce um papel consultivo, propositivo e mobilizador, enfrentando a violência com ações de prevenção. Realizamos palestras, oficinas, panfletagens, além de trabalhar a sensibilização e articulação da sociedade e também das instituições”, explica uma das secretárias executivas do Comitê, Alzira Garcia Barbosa.
No entanto, mesmo com todos os esforços, as estatísticas continuam crescendo. Para a doutora em assistência social Estela Scandola a erotização de músicas, de diversos gêneros, e a banalização da sexualidade estão contribuindo de forma agressiva para o aumento de casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. A professora e pesquisadora da Escola de Saúde Pública do Estado afirma ainda que a impunidade também carrega a culpa pelo aumento de casos.
“A erotização tem acontecido em todos os tipos de música praticamente, e a banalização também. Cada vez mais a sexualidade se torna mercadoria. Existe algo que eu chamo de ‘normatização da erotização mercantilizada’. Isso mostra como a erotização virou um comércio. Os números de violência sexual, seja de abuso, erotização, violação, pornografia, estão aumentando e, além da erotização musical, a impunidade também tem contribuído para isso”, diz Estela.
A doutora acredita que a “impunidade se tornou uma marca decisiva na violação da criança e do adolescente”. “Muitas explorações sexuais e abusos não são denunciados. Vemos também muita gente envolvida em casos de exploração sexual que acabam sendo inocentados, como políticos e empresários”, explica.
Além da punição e denúncia, a sequência de debates e discussões continua sendo uma arma poderosa como forma de mobilização para a temática. “O colegiado estadual [Comcex] reúne um grupo de pessoas que se dedicam para mobilização. O Conselho é também um dos poucos locais onde podemos nos reunir para fazer esse debate”, disse Estela.
Comcex
Criado em 1998, o Comitê de Enfrentamento da Violência e de Defesa dos Direitos Sexuais de Crianças e Adolescentes de Mato Grosso do Sul presta à sociedade trabalhos de prevenção da violência sexual, atuando na sensibilização e mobilização de cidadãos e instituições, além de fortalecer ações educacionais que envolvam crianças e adolescentes.
Mais de 20 membros constituem o Comitê, entre órgãos governamentais estão: Instituto Mirim de Campo Grande, Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Assistência Social e Trabalho (Sedhast), Secretaria de Estado de Administração e Desburocratização (SAD), Fundação de Turismo de MS (Fundtur-MS), Secretaria Municipal de Saúde (Sesau), Secretaria Municipal de Assistência Social (SAS), entre outros e sociedade civil, como Lar do Pequeno Assis e Mãe Águia.